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A Maratona Literária é um "Ovo de Colombo"
Marcelo Spalding entrevista Daniel Weller

"Um livro, uma data e um lugar para leitura em grupo. Cada um lê, em voz alta, os trechos que desejar entre goles de café e algumas pausas para recuperar o fôlego da corrida. A idéia é criarmos um grupo que se encontre nas últimas sextas-feiras do mês para a leitura de livros". Assim a Maratona Literária, novo evento da Coordenação do Livro e Literatura de Porto Alegre, se define em seu blog. A Maratona já se tornou a principal marca da nova gestão da CLL e nessa entrevista Daniel Weller, secretário desde o começo deste ano, conta um pouco como surgiu a ideia, de que forma eventos como esse colaboram com a formação de leitores e até revela que livro desejaria ver (ou ler) na Maratona.

Marcelo Spalding - Daniel, antes de mais nada, como surgiu a ideia da Maratona Literária?

Daniel Weller - Marcelo, quem trouxe essa idéia foi o escritor Pedro Gonzaga. Ele foi pra Madrid em dezembro e viu um pequeno grupo de leitores, em uma praça pública, empenhados em ler em conjunto o Don Quixote. Na minha primeira reunião no gabinete, em fevereiro, já como coordenador do Livro e Literatura, o secretário Sergius Gonzaga comentou o desejo de fazer alguma coisa semelhante na véspera do dia internacional do livro. De início não me entusiasmei com a ideia, da forma como é feito na Espanha: leitura em três dias, com interrupções durante a noite e foco nas pessoas conhecidas da área da literatura e da vida pública. Deixei a ideia no forno e um dia tive um estalo: e se fizéssemos uma grande festa em torno de um livro e colocássemos o desafio de ler do início ao final sem interrupções? Ao contrário de Madrid, todos poderiam participar dessa espécie de corrida de revezamento. Sem necessidade de inscrição prévia, quantas vezes quisesse e a quantidade de linhas que o fôlego permitisse. A ideia do revezamento é chave no projeto e aparece no logo, que faz do livro um bastão entre duas mãos de gerações diferentes. Ou seja, estamos pensando também no cuidado que deve existir entre as gerações e a importância de compartilhar espaços na cultura. O bacana do logo é que espontaneamente o público levou livros pro evento pra troca ou doação. Daí criamos o Instante/Estante de Troca de Livros. Mais um elemento de interação na Maratona.

Você acha que um evento como esse ajuda na formação de leitores pela leitura em si ou pela exposição na mídia que o evento recebe?

No fundo a Maratona Literária é um evento de letramento e de formação de leitores, tendo a presença dos veículos de comunicação ou não. Antes da presença da imprensa já estávamos com um blog, usando a enorme capilaridade da rede social do Orkut e buscando os nossos atuais 11 apoiadores, que nos ajudam a fazer a Maratona acontecer. Na real acho que a ideia é muito simples. O Gilberto Perin, matemático e grande profissional da televisão, me disse: “descobriste um ovo de Colombo”. Acho que essa simplicidade e abertura a todas as manifestações artísticas trouxe um caráter inusitado, fora do padrão, que está atraindo o público e os veículos de comunicação da cidade. O meu professor e amigo Fischer e minha nova amiga Clo Barcelos me disseram que só um carioca pra pensar nisso. Na primeira edição rolou um assumir de riscos de que fosse um fiasco, um mico, um ridículo. Mas meu jogo de cintura carioca sempre gira em torno de preferir errar fazendo, tentando, experimentando. A praia também me fez preferir os espaços abertos: a Maratona é toda realizada no Hall e nas partes externas do Centro Municipal de Cultura. Isso é simples, mas parece que faz algum diferencial. Tem o frio, mas a leitura em conjunto parece que esquenta. Quanto à exposição e a visibilidade que estamos recebemos acho natural que esteja ocorrendo. Há um trabalho cotidiano muito forte na Coordenação pra botar o ovo em pé e existem vários fatores, que somados contribuem para o sucesso do evento. Por exemplo: realizar um projeto cultural gratuito, nas últimas sextas-feiras do mês, com intervenções artísticas organizadas pelo Cabaré do Verbo, que reuna 500 participantes, que distribua café, chimarrão, chopp, comidinhas, que tenha uma ambiente com almofadas de retalhos reciclados sobre tapetes persas , com transmissão ao vivo pela web, com espaço de criação de artes plásticas aberto para todos e sem horário pra terminar tem motivos de sobra para atrair os veículos da imprensa. Essa história de não ter hora pra terminar parece que dá curto-circuito em muitos e torna o projeto ainda mais inusitado. No início era difícil de explicar. O pessoal ficava até um pouco surpreso: “Como assim sem hora pra terminar?!”. Quem me salvou foi o Chacrinha, que no seu programa da extinta Rádio Tupi dizia: “O programa termina quando termina o programa”. Simples. Exatamente como a constatação de que não podemos controlar tudo. Em breve gostaria que a Maratona saísse do meu controle e crescesse pra onde e da forma como o público quiser. Na segunda edição quando tivemos ainda mais gente, quase todas as redes de televisões transmitindo o evento e a Livraria Cultura com os livros da Maratona esgotados pensei:  essa história de ler em conjunto é do cacete, báh! Mas no fundo é esse nosso desejo de convívio, de encontrar com velhos e novos amigos e de compartilhar leituras e livros. Acho que temos isso também na Feira do Livro. As pessoas na Praça da Alfandega, se apropriando dos espaços públicos do centro e ficando longe da artificialidade e do fechamento dos shoppings. Ainda não tive muito tempo para pensar em tudo que está ocorrendo, mas acredito que é também a força da Literatura de se reinventar, nesses tempos de muitas imagens, excesso de lixo de informação e pouca coisa interessante na televisão. Quem sabe a Literatura, para recuperar um espaço que perdeu, não pode ser também concebida como uma atividade coletiva? É exatamente isso que encontramos nos eventos muvucados de mangás.

Perguntinha difícil e recorrente: na sua opinião, por que ler os clássicos? 

O Harold Bloom argumenta pela questão de que temos um tempo finito e precisamos “qualificar” nossas leituras. Gosto do Bloom, mas acho que temos mais tempo que imaginamos e nem sempre somos obrigados a seguir um fluxo de leituras canônicas e aceitar, sem olhar pros lados, apenas livros “melhores” do que os outros. Em algumas aulas no curso de Letras tinha horror quando a aula descambava para um ranqueamento dos autores. Como sou físico, tenho minhas dúvidas se a régua que faz essas medições funciona sempre. Além de saber que as medições dependem de quem está medindo. Agora ler coisa ruim me incomoda, sim. A questão é que pode ser bom pra alguém. E se é bom pra alguém e faz a pessoa pensar já justifica ter sido escrito. Agora nivelar por baixo é dureza, mas esse é o mundo que vivemos. Não adianta ficar na torre, se isolar e ficar reclamando. Formar leitores e dar acesso a escrita e aos discursos que se organizam a partir dela é tentar reverter uma espiral negativa e fazer na prática uma atividade que valoriza a educação e os professores.

Como o público tem recebido a leitura de textos clássicos na Maratona? 

A proposta, para sair da saia-justa de escolher os livros, é que o público faça as suas escolhas. A exceção da primeira edição quando precisávamos de um pontapé inicial. O Sergius sugeriu o Cem Anos de Solidão e isso deu muita força ao projeto, no momento em que 6 leitores/maratonistas, todos primeiros leitores da obra, depois de 22 horas chegaram ao final das quase 400 páginas. O legal é que todos os 6 compareceram na segunda edição e ficaram até o final também, quando triplicamos o número de leitores/maratonistas “sobreviventes”. A ideia é aumentar esse grupo, que parece que fica ainda mais motivado pela dinâmica da escolha democrática dos livros: durante o evento distribuímos cédulas de votação. Os quatro livros mais votados da noite são colocados em três enquetes, na Internet: na comunidade Maratona Literária do Orkut, no blog do projeto - maratonaliteraria.blogspot.com - e no e-mail da coordenação :  cll@smc.prefpoa.com.br. Acho muito legal e representativo que tenhamos recebido 310 votos e que o público decidiu que o livro da segunda edição fosse A Metamorfose. Apenas estranhei a polarização que houve entre o Continente e o Incidente em Antares. O Erico Verissimo superou em votos o Kafka, mas como o voto era na obra ele não ganhou. Meu voto foi para o Erico. Mas Juntar Kafka e Dyonélio foi saboroso. A presença da Andrea, neta do Dyonélio, foi muito importante.  Ela foi a primeira a ler e levou seu filho.

Mudando um pouco de assunto, quais os projetos para a Coordenação do Livro e da Literatura de POA nesse ano?

Por um lado estamos dando continuidade a todos os concursos da Coordenação. O Prêmio Açorianos está com as inscrições abertas até 30 de junho e as inscrições nos concursos Poema no Ônibus e no Trem e as Histórias de Trabalho terminam no dia 24 de agosto e 10 de setembro, respectivamente. Mantemos o curso do professor Voltaire Schilling, pela grande procura, nas segundas-feiras às 18h30, no teatro Renascença. Nos antecipamos aos muitos eventos do Ano da França no Brasil, oferecendo agora em maio o Seminário Cultura Francesa, que está lotando o teatro Renascença. Pela primeira vez estamos precisando colocar cadeiras extras no teatro. São 326 inscritos, que estão participando de duas palestras aos sábados pela manhã. Para a última semana de julho teremos 7 cursos no Festival de Inverno (teatro Álvaro Moreyra e teatro Renascença) e pela primeira vez vamos abrir 3 oficinas de leitura: conto, crônica e poesia. Além disso, estamos com um novo projeto cultural: o Prefácio ao Vivo, que já está em sua terceira edição. O Prefácio é uma ideia simples de lançar ou relançar livros, que articula noite de autógrafos com um evento artístico no teatro Renascença ou no Hall. Nesse mês, realizamos dois Prefácios ao Vivo: para relançarmos os livros Rua da Praia do Nilo Ruschel e Bairro Moinhos do Carlos Augusto Bissón convidamos o Geraldo Flach e seu piano e batemos um papo sobre as mudanças da cidade, com o Luiz Osvaldo Leite e o Luís Augusto Fischer. Para promovermos a poesia e o novo livro do Sergio Napp transformamos o Hall em um espaço de música com o Cláudio Cruz e a Angela Jobin. Na questão de ampliarmos a difusão e o alcance dos eventos todos os seminários, cursos e projetos estão sendo gravados em vídeo para posterior disponibilização no Youtube e em DVD. Além disso, tudo que fazemos está em blogs, no blogspot. Também no domínio digital, a Biblioteca Pública Municipal Josué Guimarães e a Ramal Restinga vão estar informatizadas até o final do ano e será possível pela Internet fazer reservas e consultar o acervo. Além disso, desde abril estamos com wireless gratuito e com acesso liberado à Internet. Já estamos percebendo um incremento no número de usuários da biblioteca. Para colaborar com esse aumento vamos abrir uma licitação para comprar um conjunto representativo de ficção contemporânea. A ideia é tornar a Biblioteca Josué Guimarães em uma referência em literatura contemporânea, atraindo mais público e aumentar o número de usuários das universidades da cidade. Em relação a nossa Editora da Cidade estamos planejando o lançamento de 8 livros e a realização de debates, durante a Feira do Livro, sobre a revista Porto&Vírgula, para refletirmos formas de viabilizarmos novos números.

A Maratoninha irá funcionar nos mesmos moldes da Maratona ou serão mais livros por vez?

Vamos ter uma primeira experiência com o público infantil no dia 23 de junho, às 15 horas, também no Centro Municipal de Cultura. Já fizemos contato com o pessoal da Coordenação do Ensino Infantil da SMED, que ficou de trazer as crianças e educadoras. Será a primeira edição do Prefacinho ao Vivo, com o lançamento do livro Doido para Voar, do Hermes Bernardes Jr, editado pela Artes e Ofícios. A ideia, como criança não para, é que teremos 6 ou 7 ilhas lúdicas, onde grupos de 25 crianças irão passar e interagir. Vamos transformar o Centro Municipal em um circuito infantil de uma corrida ou jogo literário, onde cada ilha terá uma atividade diferente para os pitucos: o Hermes vai ficar em uma ilha ensinando e fazendo com as crianças a técnica das ilustrações do livro, em outra teremos a Marô Barbieri contando estórias, em outro espaço os artistas do Atelier Livre, no externo uma atividade de jardinagem, em outro espaço o pessoal da Biblioteca Pública Municipal Josué Guimarães, em outro local pipoca e algodão doce e no final um lugar onde ocorra a Maratoninha. Adoraria que meu amigo Carlos Urbim e o Mario Pirata participassem também. O livro que será lido em voz alta será decidido pelo Hermes e pela Elaine da Artes e Ofícios. Como o livro do Hermes conta a estória de um garoto que quer voar, gosto da ideia de ler na Maratoninha alguns livros da série A Vaca Voadora. Quando era criança ficava procurando se achava alguma vaca no céu. Nunca achei. 
 
E o Prêmio Açorianos, alguma mudança em vista? Haverá diálogo com os escritores sobre sugestões?

Para esse ano não ocorrerá nenhuma mudança. A exceção da existência de um blog, que espero que possa favorecer a comunicação (premioacorianosdeliteratura.blogspot.com). Em 2009 começamos a repensar o Poema no Ônibus e no Trem, com a montagem de um GT de poetas. Os jurados saíram desse grupo e foi importante mostrar que a casa está aberta para todos. Aproveito e divulgo que vamos aproveitar a Conferência Municipal de Cultura, que vai rolar em setembro, para montar um GT de escritores para pensarmos juntos alguns caminhos e amadurecermos melhoramentos para o Prêmio Açorianos de 2010. 
 
Do mais, um artista gaúcho?

Um só é pouco, Marcelo. O Rio Grande é muito rico e com grande diversidade. Em Porto Alegre tenho admiração por dois caras: O Luis Fernando e o Faraco. Em Pelotas tem o Vitor Ramil. Fico hipnotizado quando ele canta. Pela afinidade e semelhanças de origem sou muito ligado na escrita da Cintia Moscovich e do Michel Laub. Gosto do humor da Claudia Tajes. Tenho vontade de escrever um livro com o Urbim e curiosidade de conhecer o Daniel Galera, para conversarmos sobre a experiência curta que ele teve na Coordenação do Livro e Literatura. Em 2010 gostaria de promover uma mesa com todos os coordenadores, pra discutirmos as dificuldades e perspectivas da área. 

E um livro que você gostaria de ver na Maratona? 

O continente, do Erico. É ainda um bom momento para levantarmos a bola sobre a perda dos acervos e o papel do poder público na preservação da memória. Além disso, adoraria ler o Erico no Centro Municipal de Cultura, no endereço que leva seu nome. Os artistas do Atelier Livre com certeza fariam intervenções criativas na rua e quem sabe o Luis Fernando nos daria a honra de ser o primeiro a ler.


24/06/2009

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Comentários:

muito bom
mauricio, sapiranga 21/09/2010 - 21:57
Porto alegre está de Parabéns pela aquisição do carioca Daniel Weller, dinâmico e criativo Secretario da Coordenação do Livro e da Cultura!
Nina Najgeborn, Rio de Janeiro, RJ 02/07/2009 - 23:10

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