Singrar curiosamente os caminhos margeados de livros da Praça da Alfândega é uma reverência para com a plenitude da vida. Milhares de leitores e admiradores da palavra escrita compreendem o que a Feira representa: ali até os deuses sempre se fazem presentes.
O que há de mais divino na Feira do Livro é a oportunidade do encontro, da troca, da aproximação, do aceno. Em meio ao acervo de títulos, palavras e ilustrações, sentimos revitalizar a nossa humanidade, o nosso sentido de comunidade.
A nossa Feira do Livro não fala só de livros. Basta espichar o olho e já nos damos conta da bela arquitetura que compõe o Centro Histórico de Porto Alegre. Temos repentinamente a sensação de que o passado nos confessa algum segredo e vislumbramos na história daquela praça as possibilidades de nosso futuro e do futuro da Feira.
A Feira espalha-se ano após ano. Alcança a margem do rio, oferece-nos o pôr-do-sol preguiçoso, como se o céu se iluminasse de felicidade ao ver tanta gente cultuar o espírito da vida – essa aproximação real entre pessoas de todos os credos, raças, idades, crenças e classes sociais.
Entretanto, nos fiapos das conversas, se ouve já essa palavra: digital. Há os que imaginam livros de outra vocação que não aquela de guardar impressa a poesia ou a prosa. Falam de downloads, de iPads, de tablets e de outras bugigangas de silício. Alguns já olham até com saudade para aquele livro da barraquinha do canto. Enquanto isso, as crianças, alheias ao futuro, colecionam cores e formas, manuseando os finos acabamentos, admirando os desenhos e as histórias que querem ver contadas outras tantas vezes. Naquela praça do nosso tão antigo centro municipal a vida pulsa.
Passeio pela praça e pergunto: o que fará o livro digital com as nossas feiras do livro? Será o destino da Feira também digital? Estará relegada aos córregos gelados dos bancos de dados, das telas de cristal líquido e dos microprocessadores? Será que um dia essa nossa praça ficará fria, sem o calor dos transeuntes?
Talvez a resposta esteja em algum livro esquecido nas prateleiras de bibliotecas, livrarias e sebos : um livro tão raro que nos fará sair de casa para procurá-lo naquela praça, naquela feira, naquela estante onde as mãos ávidas de nossas crianças nos lembrarão que a vida – ah, a vida! –, não deve ser de modo algum digital.
29/11/2010
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Comentários:
Fico imaginando como irão pesquisar os arqueólogos do futuro... Se todos os livros forem digitais, e os formatos de suporte mudam a cada ano, de que vai adiantar um arqueólogo futuro encontrar um pen drive com toda a Biblioteca de Alexandria dentro se as máquinas futuras dele não conseguirem ler aquilo? Com o livro digital, jamais teremos os "Manuscritos do Mar Morto" digitais para sacudir a história dos livros... Nayla Campos de Alencar, Esteio/RS30/01/2011 - 11:51
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