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Cinema
O Cisne Negro
Scyla Bertoja
Ao entrar na sala de projeção, como faço mais de uma vez por semana neste período de premiações em Hollywood, vejo que os espectadores da primeira fila são senhoras idosas, incluindo uma com cadeira de rodas, o que me surpreendeu, mas que é compreensível em se tratando de ballet clássico.
O filme atraíra as atenções destas damas e elas lá estavam para reviver aquela atmosfera das academias, dos ensaios, dos teatros lotados, dos aplausos, daqueles corpos esguios em evoluções que exigem quase sobre-humana força e dedicação total para conseguir dos músculos o quase impossível, aliado a uma imagem de beleza do movimento de pássaro alado, ora leve, ora violento, completa, no meu entendimento, pois que representa uma história que é de conhecimento da platéia, falada com a linguagem dos corpos exaustivamente treinados, cujos movimentos são emoldurados pela música muitas vezes criada especificamente para aquele espetáculo. O ballet que eu considero um paradoxo da capacidade humana em expressão corporal. A leveza do pássaro calcada no máximo de esforço físico; a façanha de parecer leve de uma maneira sobre-humana, sem peso, e sem a mínima demonstração do cansaço que o esforço provoca. E há dores e há cãinbras e suor. E beleza!
Mas a platéia da frente, a fileira das ex-professoras de ballet, o grupo das mulheres que já foram bailarinas e que já tiveram a felicidade de formar outras bailarinas, foi a platéia anunciada, pois já se esperava que estivessem lá.
Pergunto-me agora: será que essas senhoras gostaram de ver sua arte clássica ser tratada como um motivo para trazerem às telas as cruas cenas de sexo que vimos, inclusive com a inovação de uma sessão de drogas e álcool – bailarinas drogadas e alcoolizadas? Nunca vi isso antes! Mas não bastava e logo vieram as cenas de violência, onde uma das bailarinas mata sua colega, mas, calma, foi tudo alucinação. E finalmente a pá de cal: uma cena de sexo explícito entre duas moças, após uma sessão de masturbação alucinante da bela rainha cisne em seu casto leito, com o pavor de que sua mãe visse a cena. Claro, tudo no imaginário, para seguir o conselho do seu diretor que encarnara milagrosamente o Dr. Freud e descobrira que a mocinha era reprimida pela mãe. E para que a história fosse essa moderna versão de “sexo, drogas e rock’n’roll”, nada melhor que “sexo, drogas e ballet”. Para sentir-se relaxado, à vontade, e melhorar a performance de palco, eis a receita.
Na saída do cinema, sentindo-me enganada, solicitei meu dinheiro de volta. Então, alguém explicou-me que o filme fora produzido sob enfoque psicanalítico e eu era ignorante. Passei um dia enjoada com tal situação, mas logo vieram em meu socorro dois cineastas brasileiros que, entrevistados em programa de televisão de grande espectro de mídia, concordaram em que o filme era um grande aleijão e dificilmente levaria a estatueta. Venceram a minha ignorância e a minha opinião retrógrada. Que alívio!
01/04/2011
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