Escrevo para corroborar com o mestre e professor Charles Kiefer em seu artigo “A arte não pode ser inferior à ciência”, publicado no caderno Cultura, da edição do Jornal Zero Hora, do último sábado, dia 26. Sua indignação e lucidez sobre a não valorização do texto de ficção na “contabilidade” para o Currículo Lattes me fez recordar o que é repetido com frequência nas Oficinas do Livro que ministro: o livro de ficção está em pé de igualdade ao científico; se o segundo propicia o desenvolvimento de indústrias e soluções políticas e econômicas, o primeiro engendra a formação do pensamento e capacita as tão necessárias abstrações para se conquistar a riqueza, qualquer riqueza.
Certo, fui longe, a exemplo das aulas, alguém sempre se revira nas poltronas ao ouvir o que disse. Não me avexo. Ouso ir adiante, as coisas ganham nomes como os continentes ganharam ao longo dos séculos, como as plantas e animais ganham ao longo das pesquisas e catalogações. Mas e quem proporciona a criatividade mínima para que os nomes sejam dados? A ficção, ora.
Ouço gente de braço erguido: “professor, mesmo quem não lê ficção pode dar nome às coisas”. Sim, com certeza, mas lembremos de que até a mais entranhada na tradição das histórias orais não passam de boa ficção, e, afinal, histórias populares, e não são poucas, em algum ponto de sua invenção foram reproduzidas em papel ou ainda partiram do papel – e se substituir o elemento papel por couro, papiro ou parede de caverna, dará no mesmo.
Enfim, o que há, e o professor Charles deixa isso claro, é ignorância de uma determinada elite em não valorizar o verdadeiro teor da ficção. Talvez eu entenda isso, talvez, é legítimo imaginar, seja fruto do atraso científico brasileiro, que na conta de estamentos e estruturas organizativas, guarda muito do Brasil Império, acostumado a burocracias e castelos a preservar salários e posições. É, talvez.
Mas não tomo a linha do enfrentamento, não é esse o objetivo. Quero somente a reflexão e a reflexão que transborde e explique por que escritor e artista são bichos condenados à miséria. E não me venham dizer que a miséria e o sofrimento alimentam a arte, porque dá no mesmo em dizer que o Herzog se enforcou de uma altura menor do que o comprimento de suas pernas, ou seja, é mentira de quem quer calar, não debater. Pois, se não se valoriza oficialmente o texto de ficção e por decorrência o escritor nas academias, ali, onde vivem muitos escritores – que são professores por necessidade –, como podemos exigir da sociedade o mesmo valor? Valorizemos a ficção que a riqueza a todos virá.
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