Felipe Azevedo é compositor e violonista, premiado com 5 prêmios
Açorianos, além de prêmios em festivais locais e nacionais.
Acaba de ser contemplado com um prêmio da FUNARTE que viabilizará
a produção do próximo disco. Nesta entrevista, fala sobre
seu trabalho, o atual momento da música e a necessidade de profissionalização
do artista:
Marcelo Spalding - Vamos começar pela novidade: o prêmio
da FUNARTE que viabilizará a produção do próximo
disco, Tamburilando Canções. O anterior já havia sido fruto
de uma premiação, então ao que você atribui tais
prêmios?
Felipe Azevedo - Quando se participa de um concurso, um processo de seleção
dificilmente se sabe que critérios irão embasar, fundamentar as
escolhas de um júri, entretanto, creio que a coerência e a fundamentação
que norteiam a produção de um trabalho autoral sempre são
requisitos bem vindos, o que requer de uma autoralidade muita reflexão
e labuta no processo de criação. No que se refere a estas duas
premiações - Prêmio Petrobrás Cultural e Funarte
- referentes ao meu disco anterior (Percussìvé ou a prece do louva-a-deus)
e a este novo (Tamburilando Canções - Felipe Azevedo - Violão
com Voz) creio que a continuidade e a maturação perceptíveis
num processo autoral em andamento, tenham norteado a escolha de ambos juris.
Esse tipo de prêmio contribui muito na produção,
mas qual é hoje a maior dificuldade de um artista com trabalho autoral?
A divulgação, a distribuição?
Produção, divulgação e distribuição
são etapas que agregam uma ação final: atingir um público.
Existem compositores, e conheço alguns, que produzem e se plenificam
nesta instância; não querem e não estão preocupados,
em gravar, divulgar, etc. Entretanto, há outros que ao se integrarem
paulatinamente em todo este processo se deparam com um contexto chamado mercado
cultural: uma outra engrenagem paralela à ação artística
- a produção, os meandros mercadológicos, divulgação
na imprensa, distribuição, etc. Acho que o que realmente desgasta
é o artista ter de se envolver com estes processos, muitas vezes por
não ter quem o faça, e neste envolvimento desperdiçar a
sua melhor energia que é a da criação. A divulgação
e a distribuição são peças desta engrenagem mercadológica
que num país das proporções do nosso complica bastante
as coisas.
Como tu vês o cenário atual da música hoje? Há
espaço para mais trabalhos autorais ou as músicas comerciais ainda
concentram muito o merado?
Acho que um trânsito paralelo sempre existiu - músicas de maior
visibilidade, algumas de consumo imediato, e músicas voltadas para nichos
de público mais específicos. O que é curioso é que
cada vez mais o mesmo público que 'degusta' a música de 'efeito
imediato' também pode estar adorando 'degustar' outras músicas,
e creio que a versatilização do acesso da música até
o público via recursos tecnológicos como este espaço (o
AG) têm encurtado gradativamente estas distâncias atuando inclusive
na diversidade do 'gosto' popular.
Tamburilando Canções será novamente um álbum
de voz e violão, certo? Por que essa opção estética?
Não. Tamburilando Canções será novamente um disco
de Violão com Voz, com mais proximidade ao anterior e ainda recente,
o Percussìvé ou a prece do louva-a-deus. A opção
estética é fruto de duas razões: uma circunstancial e outra
estética de fato. A circunstancial gerada pelo desejo de independizar
a atuação musical desvinculando outros acompanhamentos instrumentais.
Hoje em dia vender um show em que se tenha que pagar o cachê de músicos
competentes e qualificados que estejam te acompanhando, nem sempre é
fácil, aliás, é custoso muitas vezes financeiramente. Então
a prerrogativa da atuação solo tomou proporções
expressivas. A segunda razão é fruto da pesquisa sobre o potencial
do meu instrumento de trabalho e veículo de expressão - o violão.
Na história do cancioneiro popular brasileiro o violão - conforme
o etnomusicólogo Carlos Sandroni- acabou se constituindo num instrumento
de síntese. À medida que fui sistematizando as funcionalidades
do instrumento no meu processo criativo também percebi o quanto de recursos
ele oferece, e o resultado disto foi uma mudança radical na minha maneira
de pensar, de abordar a canção, o fazer canção.
Para mim a canção hoje não é uma escuta de uma melodia
principal sendo acompanhada por um violão, e sim uma melodia - no caso
a voz - dialogando, interagindo simultaneamente com o violão e vice-versa,
daí o nome Violão com Voz. Por sua vez todos os ingrediente desta
canção: letra, desenho melódico, ambientação
sonora, entoação do canto... todos também assumem função
interativa na internalidade desta canção. O resultado disto é
que a escuta fica dilatada. Não há um ponto fixo de escuta: a
voz, a melodia, os acordes, a letra e sua temática etc. Tudo está
interligado,integrado e fazendo parte de um todo, ou seja para perceber as partes
é necessário atentar ao todo.
Além de músico, tu também escreves comentários
sobre música no AG e em outros veículos. Como tu vês a crítica
musical hoje em dia?
Acho que as palavras do crítico musical Arthur Nestrovski respondem a
esta questão. Hoje em dia se vê muita opinião de gosto pessoal
e pouquíssima análise reflexiva, embasada sobre música.
No que se refere àquilo que faço no AG, tecer comentários,
é exercitar o ofício de uma reflexão embasada sobre música,
mesmo porque não tenho pretensão nenhuma de ser crítico
musical.
Muito se discute, aqui no site, a profissionalização do
artista, e eu que acompanho tua carreira de anos fico feliz em perceber que
tens obtido sucesso como profissional que vive de música. Qual o segredo?
Persistir e refletir muito sobre o fazer musical e as escolhas profissionais.
É um trabalho de muita persistência e fôlego e um aprendizado
constante. As melhores respostas nem sempre são as primeiras que surgem
e às vezes são.
Uma dica para quem gostaria de viver de música.
Pensar muito se realmente deseja seguir este caminho. Para mim o fato desta
estar profundamente incruada na minha vida existencial e sensível já
bastou para a escolha. Respiro e vivo muito da e de música.
25/11/2008
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