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Teatro

Homens de Perto 2
Lene Belon*

Pois bem, aqui vou eu dar um palpite sobre Homens de Perto 2. Não sou crítica de coisa alguma, falo apenas como uma pessoa do público que tem seus próprios gostos e maneiras de ver o mundo. Sei também que, se havia outras pessoas na plateia ou mesmo no palco e na produção que pensam como eu, devem ser poucas... No entanto, não creio que devo me abster de dizer algo simplesmente por fazer parte da minoria. Então, aí vão algumas observações.

A peça, como um todo, me agradou. Tem alguns diálogos engraçados, os atores são muito bons, a trilha sonora é ótima. Repito, como um todo, a peça diverte – e suponho que seja esse seu propósito. Em meio a tantas produções também com essa finalidade, Homens de Perto 1 e 2 são melhores. Sabemos que muitos têm recorrido ao humor fácil, aos clichês, aos palavrões gratuitos, enfim, têm sido utilizados recursos pobres como atrativos para a venda de ingressos num mercado sempre tão “sofrido”. Pergunto-me: quem é esse público que sai de casa para ver esses espetáculos? Imagino que sejam pessoas que querem rir, querem “desopilar”, como se costuma dizer. Não parecem querer pensar muito sobre o que se diz ou se mostra no palco. Essas pessoas querem esquecer os pensamentos profundos e as preocupações do cotidiano, ou seja, não estão no teatro para refletir, mas para rir. Mais ainda, de certo modo, elas até já sabem do que querem rir.

Agora, pergunto: é possível combinar humor com reflexão? Bem, eu diria que muitas obras de Woody Allen e de Pedro Almodóvar fazem essa combinação com sucesso. E aí não posso deixar de lembrar que já ouvi muita gente dizer que detesta esses cineastas, que não acha graça nenhuma em seus filmes... Pois é, persiste aquele dilema: como agradar a gregos e troianos e ainda ter lucro com isso? Acho que a resposta é evidente: não tem como! Portanto, temos que “segmentar o mercado”, para usar a linguagem do marketing... Pode ser que não se esteja consciente dessa segmentação, mas ela existe. Há públicos e públicos. Daí me vem a seguinte pergunta: quem é o público de Homens de Perto?

Não se pode negar que uma peça de teatro, como produto de cultura – tanto no sentido de produção cultural quanto no de mercadoria de consumo –, “vende” alguma coisa, e o que ela vende é indissociável do próprio ambiente cultural que a gera, que lhe dá condições de existência. E é aí que o sapato me aperta os calos! Nosso dito ambiente cultural parece estar à míngua em vários quesitos, o que se traduz nos produtos que ele gera e, ao mesmo tempo, consome.

Homens de Perto 2 alterna bons e maus momentos quando se trata de conteúdo. Mil perdões, mas a piada "do anão e da gorda" me deixou muito incomodada logo no início da apresentação. É uma piada preconceituosa, não? Era para rir? É bom expor condições que em geral são tidas como “desvios” dos padrões na nossa sociedade e ainda rir delas? Esses desvios devem ficar no circo, junto com palhaços e personagens bizarros?

Esse foi o começo. Depois – e este é o ponto que mais me deixou desconfortável – foi o modo como as mulheres são posicionadas na peça: do jeito mais vendável possível. Seja em certas falas, seja na atuação (???) da moça que contracena com os atores, as mulheres são enfeites, são frívolas, têm “cabeça vazia”, como diz o mágico ao tentar hipnotizar a jovem, que, ao que parece, está ali só para mostrar o corpo e carregar as cadeiras do cenário. Talvez seja muito divertido para um homem, encarnado no ator, ter uma mulher sob seu controle, fazendo-a “rebolar gostoso” ao seu comando. Talvez seja engraçado dizer que uma mulher é “modelo, atriz e vagabunda”. Talvez seja ainda mais sensacional fazer desaparecer um homem e fazer aparecer uma mulher vestida com o clássico figurino da Playboy, objetificando-a ao extremo como produto a ser consumido. Sim, isso é muito vendável – e, para uma ou duas pessoas da plateia, talvez seja também um pouco triste.

Então, é possível achar alguma graça em Homens de Perto 2? Claro! Ri muito da parte sobre o separatismo, ponto alto da peça, em que a imaginada superioridade gaúcha é colocada em xeque. Achei engraçada a placa que dizia: “Curço de Portugueis. Call now” - apesar de a grafia equivocada poder mostrar desconsideração por quem é privado do domínio da língua portuguesa culta, isso quando mesmo os "letrados" cometem seus pecados (principalmente em tempos de novo acordo ortográfico).

E que tipo de humor é esse que me faz rir? É um humor que me faz ver algo, que me “dá um toque” sobre alguma coisa da realidade para que eu aja sobre ela e a modifique com meu próprio comportamento. Não é o humor que replica preconceito e machismo. Acredito que humor também pode mostrar caminhos, também pode fazer refletir e, com isso, afetar e mudar modos de ser e de estar no mundo. Seria bom pagar para ver.

 

* Lene Belon, bacharel em Letras (UFRGS) e especialista em Linguística Aplicada (PUCRS), há 20 anos atua na área de tradução e revisão de textos científicos, dedicando-se também ao ensino de Língua Inglesa para estudantes de pós-graduação.


26/07/2010

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